domingo, 13 de novembro de 2011

Olhando para trás: a importância da história do Direito para a decisão jurídica


por Mariana Melo

            História do Direito, na acepção deste breve ensaio, está longe do que se estuda nas Universidades, em matéria com o mesmo nome. Frustra-se, pois, aquele que espera encontrar referências ao Código de Hamurábi ou considerações sobre o Direito Romano.
            A história do Direito de que aqui trato é um pouco diferente – refere-se a esta atividade constante, construída no tempo; enfoca, todavia, o instrumento pelo qual ela se consubstancia: a decisão jurídica.
            À “história” das decisões jurídicas, costumamos chamar de precedente, e sua importância no direito legislado vai além das enfadonhas referências nas petições judiciais. Embora não haja, em nossa tradição, um respeito aos precedentes de forma semelhante à que ocorre nos países do common law, conferir importância ao passado se impõe como uma obrigação a fim de preservar a segurança jurídica e, em última instância, a própria legitimidade do Poder Judiciário.
            Isto porque, não sendo mais possível tratar o Direito como mero instrumento de aplicação subsuntiva, pelo juiz, das normas vigentes no ordenamento jurídico, abre-se, para o aplicador, inúmeras possibilidades de interpretação, de forma que a norma assume um caráter construído de sentido, não sendo possível tratar o processo decisório como mera descoberta ou revelação de algo intrínseco.
            Se, por um lado, tal atividade criativa, além de inevitável, é também desejável (a fim de, por exemplo, imprimir maior plasticidade e adaptabilidade às normas jurídicas, sobretudo à luz do caso concreto), por outro, cria o risco de desvirtuamento da própria função jurisdicional, fazendo do juiz não só um “legislador intersticial”, mas transformando-o em um questionável criador de políticas públicas. Não obstante, ainda acentua a imprevisibilidade das decisões judiciais, desprivilegiando a própria segurança jurídica.
É neste cenário que se evidencia a importância do precedente, fazendo-se imprescindível, ao magistrado, a observância não só do texto legal – o qual, por si só, já lhe impõe limites -, mas a história de um direito que o antecede e que, ao menos, poderá direcioná-lo à melhor tomada de decisão, evitando o que se convencionou chamar de “ativismo judicial”.
            Fica, pois, a reflexão: cria-se, geralmente, o Direito para o futuro, e faz bem aquele que o analisa pelas suas consequências. Entretanto, pesa, sobre a caneta do juiz, não só o resultado que se produzirá para frente, mas a importância de uma história construída, a qual o obriga, também, a olhar para trás – ainda que seja, excepcionalmente, para encontrar razões robustas para dela destoar.
Não teremos um juiz Hércules. No lugar dele, por certo, preferimos um juiz Jano[1].



[1] Na mitologia grega, Jano era porteiro celestial, sendo representado com duas cabeças, representando os términos e os começos, o passado e o futuro. Do seu nome advém o mês de Janeiro.


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